Estrada de Damasco

O percurso e o destino

July 31, 2006

A banhos

O Jagoz retorna, durante umas semanas, ao seu porto de origem.
Quão difícil é explicar o sentido de pertença a um conjunto de ruas e de pessoas, a um sol que brilha arrefecido pelo vento e pela maresia e a um mar que poucas vezes tem algo mais a oferecer senão luta.

Ad majorem dei gloriam

A Igreja hoje celebra S. Inácio de Loyola, referência óbvia deste blog que, todavia, não faz o suficiente para o honrar.

July 21, 2006

Direito da Guerra

As convulsões que o mundo atravessa só começarão a ser resolvidas a partir do momento em que os Estados redesenharem o ordenamento jurídico que compõe o Direito da Guerra.
As actuais regras foram concebidas à medida de um mundo configurado de acordo com o conceito de Estado-nação emergente da Revolução Francesa. Ou seja, protegiam-se os direitos dos povos organizados de forma convencional - ou de povos que aspiravam a organizar-se de forma convencional -; os actores beligerantes eram Estados convencionais; o próprio conflito era protagonizado por forças armadas convencionais; e o resultado dos conflitos redundava, por via de regra, na ocupação de territórios ou na criação ou extinção de Estados.
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Sucede que várias coisas mudaram.
Desde logo, mudaram os beligerantes. Os conflitos do Afeganistão, do Iraque, do Líbano e da Tchechénia (assim de repente) opõem um Estado convencional - mais ou menos vinculado ao Direito da Guerra existente, na medida em que adiram com maior ou menor voluntarismo a um direito que é todo ele convencional - a inimigos que se organizam de formas que escapam ao paradigma da soberania.
Acresce que esses novos beligerantes, apesar da sua organização precária, praticam a guerra numa escala e com armamento próprios de guerras convencionais.
Ou seja, temos o seguinte paradoxo: os conflitos actuais assumem proporções e características de guerra convencional; mas uma das partes é um beligerante não convencional, não vinculado às normas internacionais que lhe seriam aplicáveis nesse conflito.
Por último, não há como olvidar que esses novos beligerantes têm por trás de si (como instigadores ou cúmplices) Estados convencionais - o Líbano é um caso exemplar -, o que parece conduzir a uma nova figura: a guerra por interposta pessoa...
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Se o status quo jurídico não permite que os Estados se defendam e defendam os seus povos com eficácia - em bom rigor, se o status quo jurídico é um estorvo para os Estados convencionais de que os novos beligerantes procuram tomar partido -, das duas uma: ou o ordenamento muda; ou o ordenamento mantém-se e torna-se em letra morta, passando a ser ignorado pelos Estados que se encontram sob ameaça. É que não é possível exigir a um povo que não se defenda porque essa sua defesa não casa bem com um enquadramento legal concebido para outras eras. Se a alternativa residir entre a sua defesa (ilegal) ou o seu sacrifício (legal!), não tenhamos dúvidas para onde cairá a escolha. E se a defesa for originariamente ilegal, «perdido por um, perdido por mil».
Por isso, é esta a nossa opção: ou temos outro Direito ou simplesmente não teremos qualquer Direito.
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No que toca ao jus ad bellum, é preciso remover os antolhos que neste momento impedem os Estados de reagirem contra ameaças ou contra agressões oriundas, por interposta organização, de outros Estados. Não tenhamos dúvidas que colocar o Irão ou a Síria na linha da frente da responsabilização quanto aos acontecimentos de Israel levaria, necessariamente, a um abrandamento do apoio dado ao Hezbollah. Seguindo as velhas regras da Teoria dos Jogos, aumentar a potencialidade de conflito reduz o número de conflitos.
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Quanto ao jus in bellum, há que configurar legalmente outras entidades que não Estados como entidades beligerantes, em relação às quais se entende que se aplica o Direito da Guerra e se entende que há um dever de elas próprias aplicarem o Direito da Guerra. Aceitar o jogo sem regras proposto por essas organizações é a pior opção que se pode tomar: no seu próprio jogo, elas vencerão sempre.
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Por último, há que dar um passo em frente e gizar um jus post bellum (como reclama Michael Walzer, por exemplo). Talvez tenha sido sobretudo isso que faltou no Afeganistão e no Iraque. A situação vivida no terreno após o termo do conflito não pode ser definida em função do (mau) percurso seguido no jus ad bellum e no jus in bellum, mas sim (apenas) de acordo com a preocupação de criar, novamente, uma situação de pleno Direito.