Estrada de Damasco

O percurso e o destino

May 16, 2006

Raízes

Há lugares de encanto para onde pende o nosso coração, onde colocamos a âncora da nossa existência e de onde podemos dizer que somos. De onde gostamos de dizer que somos. Geralmente esse ancoradouro é escolhido pela fortuna, pelo acaso: será o local onde nascemos, onde crescemos ou onde vivemos algum momento particularmente marcante que definiu o nosso carácter - são, pois, lugares que não se escolhem; são lugares que acontecem, o que muito contribui para fortalecer a noção da arbitrariedade como força motriz da nossa vida.
Há todavia lugares pelos quais cativamos um gosto e uma certa identificação, seja em resultado de conhecimento empírico seja em resultado de uma projecção sobre um lugar comum. No fundo, são os lugares de onde gostaríamos de dizer que somos.
Um desses lugares que me fascinam é a Itália. Agrada-me aquela incontinência emocional tão latina e a sua torrencialidade espiritual, que se manifestam tão bem na sua língua e na sua música. Agrada-me a sensualidade latente daquele povo, que se vê na sua monumentalidade, na sua mesa, na vivacidade do sol e nas suas mulheres. Encanta-me a riqueza cultural, as idiossincracias de cada lugarejo e a ritualidade social tão própria. Fascina-me o sentido de destino interrompido, de grandiosidade adiada, de extravagância desesperada.
E admiro um certo espírito de irreverência quase-anárquica dos italianos merionais, que recusam trocar a sua identidade por uma ordem produtiva e maquinal - à imagem dos seus irmãos do norte, que no fundo só aspiram a vir a ser alemães.

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